segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

Expedição ao Cerro (de Alma Welt)

Bem cedinho partimos pro Jarau
Com nossas mochilas e cajados.
Chegamos, não mais jovens e corados,
Tendo atravessado o rio a vau.

Perdi nessa jornada um meu amigo,
Outros tiveram medo e desistiram.
Os amores que, valentes, persistiram,
Surpreendentemente estão comigo.

Os que restamos com fé e sem cobiça,
Mantendo a esperança como antes,
Chegaremos à sala dos diamantes

Onde a Salamandra se espreguiça
Do sono milenar enquanto espera
Vencermos em nós mesmos nossa fera...

(sem data)

Nota
Como muitos da Alma, soneto nitidamente simbolista. O mito gaúcho da Salamanca (ou Salamandra) do Cerro do Jarau, eternizado por Simões Lopes Neto, foi aqui abordado como metáfora da jornada da vida. O rio atravessado a vau certamente deriva de Heráclito... (Lucia Welt)

domingo, 17 de janeiro de 2010

Receita de licor (de Alma Welt)

É tão oculto e raro o ambiente
Que se faz necessário ao cozimento
Da polpa das horas com a semente
De poesia, na alma em fogo lento.

E depois de decantar e arrefecer
Deixar fermentar por muitas horas
Antes que vás servir e oferecer
Mas evitando fazê-lo às senhoras,

Pois esta bebida não foi feita
Para a mente fraca ou leviana,
Nem pra ociosos pés-de-cana...

Esse licor é claro, forte, mas sutil,
E nasceu com Deméter, da colheita,
Detentora do alambique e do funil.

(sem data)

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

O espectro (de Alma Welt)

Diante da casa detive meu cavalo
E notei que continha não memórias,
Mas ninharias que não foram pelo ralo
Do tempo a escorrer as suas horas...

Dei rédeas ao meu pingo e retornei
Pois prefiro os espectros com que privo
Ainda que um pareça um morto vivo,
O Valentim, cuja saga já contei...

Pois bem: no seu pescoço ainda deixa
Um resto da corda que o sustenta
Para a toda a eternidade dos perdidos.

Mas posso conviver com sua queixa
Enquanto o coração ainda agüenta
Os lamentos, o pranto e os gemidos...

17/04/2005