terça-feira, 7 de junho de 2011

Os Espectros (de Alma Welt)

Bons espectros que, sei, velam meus sonhos
E sussurram recados de outras eras,
Às vezes me constrangem, pois tristonhos
Trazem queixas, protestos e quimeras.

A Anita que morreu recém-parida
E Netto, ao que parece, assassinado;
Bento em sua estância, mas falida,
Precisando de ajuda, e humilhado...

Entre os próximos, o Vati que me espera *
A mim, que me criou qual Galatéia, *
Mas fiel ao seu cinzel que ainda impera.

Mas fantasma que vivo me enlouquece,
É Rodo*, que tem, própria, a sua platéia
No verde onde o amor e o grão fenece... *


Notas
*...o Vati que me espera- Vati (papai, em alemáo pronuncia-se Fáti, de Vater, pai ( pr. fáter)
*A mim, que me criou qual Galatéia- referência ao Mito grego de Pigmalião, o escultor que esculpiu no mármore uma estátua tão bela de mulher, que pediu à deusa Venus que lhe desse vida. A estátua criou vida própria, se chamou Galatéia, e logo abandonou o artista apaixonado.

*Mas fiel ao seu cinzel que ainda impera - Alma se considerava uma criação de seu pai que quis moldá-la como uma obra de arte(e conseguiu), depois morreu. Alma no verso quis dizer que permanecia fiel à arte à qual ele a devotou.

*Rodo - o irmão da Alma, jogador profissional de poquer.

*No verde onde o amor e o grão fenece - Alma se refere ao pano verde das mesas de jogo.

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011


A Visita da Dama (de Alma Welt)

Não morrerei de amor como pensava
Que seria o meu fim quando guria,
Mas certamente baterei naquela aldrava
Mais cedo, que é o que a castelã queria

E disse quando ao meu encontro veio
Quando eu ia a vagar colhendo flores...
E recordo que não tinha um porte feio
Mas sim de dama digna de amores

Que por aqui passava como aragem,
Honrada me deixando, e receosa
De incomodar tão ilustre personagem.

Embora não marcando hora nem dia,
Agradeci-lhe a visita tão honrosa
Que deixou claro o quanto me queria...

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Por um triz (de Alma Welt)

Contar o meu segredo para o mundo
Seria uma irrisória pretensão,
Mas tudo o que está no mais profundo
Revelar-se é a sua grande vocação...

Quem sou, existirei, tenho uma vida?
Há quem diga que sou só a criação
De uma notável criatura dividida,
De um escritor de gênio a obsessão.

Mas mesmo por um triz a revelar-me,
Só admito que sou anima bem viva
E dizer isso não é somente charme,

Mas a real natureza e condição
De minha existência recidiva
Em outras além desta encarnação...

04/02/2011

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Amores mortos (de Alma Welt)

De noite perambulo o casarão
Na calada dos murmúrios e segredos
Enquanto os amores mortos vão
Tentando refazer os meus enredos...

E bem depois das doze badaladas
Neste decrépito relógio do salão
Começam as intrigas renovadas,
As lágrimas, suspiros, rebelião...

Todos eles, na verdade, foram meus...
Reconheço esses hóspedes inquietos
Que tomam por descaso o meu adeus,

E gritam, cerram punhos e ameaçam:
“Tu nos fazia crer-nos prediletos!
Tua ternura e beleza nos desgraçam!”

(sem data)

domingo, 2 de janeiro de 2011

O Mito (de Alma Welt)



O Mito (de Alma Welt)

"Por quê pareces ser tão misteriosa?"
Perguntou-me a jornalista de repente.
"Tens um olhar profundo, mas ausente,
E falas mais em verso do que em prosa."

"Tudo aqui me parece meio estranho,
Perdoa-me que o diga, és já um Mito
Mas se ao bajular-te nada ganho
Confesso que pra mim é esquisito"

"Escreveres assim com essa tal pena
Ou pluma, sei lá, e ainda de ema
Com tinteiro e tinta de molusco,"

"Ou sépia,vá lá... não leva a mal,
Mas temo que a matéria que eu busco
Causará certa descrença em meu jornal..."

(sem data)

A Máscara (de Alma Welt)


Mascarado (Carnaval)- desenho de Guilherme de Faria

A Máscara (de Alma Welt)

Sob a máscara estranha permanece
E eu percebo pelo porte pequenino
Durante uma folia que se aquece,
Que não passa de guria ou menino.

Mais não pude precisar desse mistério
Pois não emite canto, grito... nada!
Talvez vá retornar ao cemitério
Ao chegar quarta-feira acinzentada.

Já começo a ficar amedrontada
Pois durante todo, todo o Carnaval
Fez seus meneios sob minha sacada

Mas debaixo da cabeça monstruosa
De patética hibridez medieval,
A tristeza é minha, em verso e prosa...

05/03/2003