domingo, 24 de agosto de 2008

Exorcizando (de Alma Welt)

Matilde veio logo me avisar
Que uma sombra rondou o casarão
E parou de frente ao nosso sótão,
Depois partiu no rumo do lagar.

"É o Valentim!" ela adverte-
"Que olhou para onde se enforcou,
Voltou para onde o vinho verte
E ali novamente se afogou."

E eu, a quem não custa espicaçar,
Saí no temporal e fui às uvas
Para o tal fantasma exorcizar:

"Perdoa, a ti me dou, tardia embora,
E me desnudo sob o frio de tuas chuvas
Que são as tuas lágrimas de outrora!"

(sem data)


Nota

Valentim- Para quem ainda não sabe ou não leu o romance autobiográfico da Alma "A Herança", Valentim Ferro foi o último proprietário gaúcho autêntico de nossa estância (antiga Querência Farroupilha, agora Sta Gertrudes) e que endividado acabou vendendo sua propriedade para o nosso avô Joachin Welt, em seguida por desgosto enforcando-se no sótão do próprio casarão. Alma conta como nosso avô narrou a ela ter encontrado o corpo de Valentim, ainda quente como o mate fumegante esparramado da cuia (e bomba) sob os pés do enforcado, este todo ataviado nas sua melhor bombacha, botas, esporas, faixa, chapéu, lenço vermelho farroupilha, e tudo.
Alma dizia ter tido vários encontros com o espectro do infeliz proprietário autêntico derradeiro, com o qual ela acreditava termos uma dívida insaldável, usurpadores que éramos desta propriedade farroupilha tradicional, nós, "boches arrivistas" que viemos plantar uvas numa terra tradicional de gado, charque e mate. (Lucia Welt)
Postado por Lúcia

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